sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Nietzsche pra lá de Bagdá




Toda a minha vida procurando os espíritos livres, Henri Miller, Bukowski, Gutierrez, Hilst, Kerouac, Gauguin, Modigliani.... me levaram aos 39 anos até Nietzsche, me levaram até que enfim "Para Além do Bem e do Mal".
Livro para ser lido com muito cuidado e respeito. A princípio desprezo a opinião de Nietzsche sobre as mulheres e por vezes sua falta total de humanismo e desprezo pelas "castas inferiores" bem como sua predileção pelo aristocrático. Não é possível que a vida se resuma a uma eterna "luta pelo poder". Há excessões meu caro!
Por outro lado temos que enaltecer sua visão artística do mundo, seu estilo e sua luta pelo afastamento da vulgaridade e pela descrição nua e crua do mundo como ele é, bem como as críticas severas e com propriedade sobre à visão metafísica das coisas e à filosofia de conveniências.
Enfim, nada melhor que alguém em 1886 dizer que a ambição metafísica "prefere um punhado de "certeza" a toda uma carrada de belas possibilidades".
Que: "não se deve ir a igreja quando se pretende respirar ar puro"
"O cristianismo deu veneno para Eros beber. Este, na verdade, não morreu, mas ficou viciado".
Mas o mais importante é o manifesto para os filósofos do futuro contra a felicidade geral dos rebanhos e suas cantilenas "igualdade de direitos" e "piedade para os que sofrem", bem como as deturpações e uso indevido do falso altruísmo dos poderosos e a aceitação passiva dos comandados. ABAIXO O INSTINTO DA CONSERVAÇÃO!!!!!!DO MEDO!!!! DA FALSIDADE!!!!!
Afinal: "A objeção, o desvio, a desconfiança alegre, a vontade de brincar são sinais de saúde. Tudo o que é absoluto pertence à patologia".
Na mesma esteira nos conclama a sair do marasmo da "fácil comunicabilidade da necessidade" das "vivências apenas medíocres e vulgares". Sentimento facilmente vivenciado em estádios de futebol, igrejas ou Shoppings Centers.(...)
Pena que a mente humana é capaz de deturpar qualquer coisa, sendo Nietzsche em momento histórico peculiar, indevidamente apropriado pelo anti-semitismo, nazismo e facismo, logo ele que anteviu às grandes guerras, escreveu claramente contra o anti-semitismo, inclusive enaltecendo o povo judeu e criticando o racismo e xenofobismo alemão que começava a formar-se. Mas conforme o próprio Nietzsche sabia: O ser humano é capaz de tudo em sua luta pelo poder, e nisto ele foi traído pela própria irmã que filiou-se aos ditadores medíocres de sua época.
Quem vê o bigodão acima pensa numa pessoa reclusa, solitária, de mal com a vida, que, como sabem, terminou seus últimos 10 anos com problemas mentais. Não é bem assim. Nietzsche tem uma visão(em alguns momentos) muito mundana e alegre da vida, o que se observa quando diz que existindo um Deus este deveria dançar; que o concubinato foi corrompido pelo casamento ou que "maturidade do homem significa o reencontro com a seriedade que se tinha nas brincadeiras de infância".
Enfim, entre os vários Nietzsches, fico com o alegre, o não rancoroso, o artista, o literato, aquele que buscou o perigo, que foi de encontro à mente tacanha e conformada de sua época, aquele que apesar de todo o sofrimento não cambiou à vida por nada e cheio de orgulho por si, glorificou-se na eternidade e nos deu lições como está:
"O essencial "no céu e na terra" é, repito, que se obedeça durante longo tempo e num único sentido: a longo prazo. É assim que se obtém e se obteve sempre algum resultado pelo qual vale a pena viver na terra, por exemplo virtude, arte, música, dança, razão, espiritualidade - qualquer coisa sublime, refinada, louca e divina".
Para os filósofos do futuro e os espíritos livres: "Aquilo que nos atrai é exatamente o infinito, o desmesurado. Assim como os cavaleiros no cavalo desenfreado, largamos as rédeas perante o infinito, nós, homens modernos, semibárbaros que somos - e sentimos a nossa felicidade apenas onde nos sentimos mais - em perigo".
E pergunto de forma indignada à Madre Helena ou à Irmã Batista ou a qualquer uma daquelas maravilhosas freiras do Colégio Santa Úrsula: Porque demorei 39 anos para conhecer Nietzsche????

Nenhum comentário:

Arquivo do blog