terça-feira, 15 de novembro de 2011

A Primavera do Dragão


“A Primavera do Dragão” de Nelson Motta , Editora Objetiva é uma primorosa edição e bem delineada biografia de Glauber Rocha no curto período compreendido entre a infância do cineasta na Bahia e a consagração em Cannes com o filme “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (infelizmente coincidindo com o golpe militar de 1964). Nelson Motta como todos sabem é um cara “antenado”, “ligadão” que inclusive me convenceu em outros tempos a visitar uma Igreja Batista no Harlem às oito da manhã de domingo. Tudo pela música!(desconfio até hoje que ele “leva um” do Pastor). O Nelson tem essa coisa de ampliar o mito e de quebra sem qualquer dor na consciência lucrar algum. Deixando a falta de distanciamento e mercantilismo de lado é delicioso embarcar em outros tempos especialmente no período de meados dos anos 50 e 60 quando a cultura era algo grandioso, com intuitos nobres, ideologias, os artistas se conheciam eram amigos, se ajudavam etc. Os “causos” durante as filmagens de Deus e o Diabo na pequena Monte Santo são ótimos. A população local achava que a Yona Magalhães era uma princesa e foram seduzidos a trabalhar como figurantes durante horas e dias em troca de leite em pó. Bons tempos....Acho que é isso que está faltando no cinema atual e porque não nas artes em geral. Precariedade, falta de profissionalismo. Não quero dizer que tudo se resume a “uma câmera na mão e uma idéia na cabeça”. Tudo tem seu tempo é claro, ninguém agüenta mais isso; mas verifico que Glauber e os demais precursores do cinema novo ainda tem muito a ensinar. Glauber é o exemplo da vontade de mudar as coisas, do inconformismo, da subversão, do radicalismo. Nos dias de hoje só isso é um alento, uma inspiração. (e desconfio que vem continuação da biografia por aí!). Isso é claro se o sertão não virar mar.

domingo, 13 de novembro de 2011

Charque de Marcelo Mirisola



Todo lançamento de um novo livro de Marcelo Mirisola não é apenas um lançamento mas um acontecimento(para desespero de muitos). Deixando todas as polêmicas de lado fico com o que disse o escritor e roteirista Renzo Mora em seu blog :” Mirisola é importante por ser um grande escritor.(...) Somos contemporâneos de um grande artista”. Tanto que de minha parte não deu para esperar a boa vontade das livrarias daqui de Ribeirão Preto e logo encomendei o meu exemplar de “Charque” na competente e simpática Livraria Travessa do Rio de Janeiro. Foi muito engraçado quando o meu filho de oito anos chegou na sala e me perguntou? “-O quê você está lendo pai? Tubarão? “-Tubarão?” “–É pai...Charque (Shark) não é tubarão em inglês?” Muitos risos o que me levou a explicar para ele que Charque não era tubarão mas sim e provavelmente isca de tubarão; Pois não é que o livro me fisgou de primeira? Está tudo lá novamente: as empregadinhas, os azulejos, os manos, os pastores, o mundinho literário, a classe média, a velha apresentadora...e o improvável lirismo que o escritor consegue tirar de coisas tão díspares e multifacetadas. E por falar em risos a muito tempo que eu não ria tanto com um livro na mão. (desde Pornopopéia). Meu filho deve achar que estou ficando louco, variando, rindo sozinho....E não sei quem foi que falou que o Mirisola não arrebenta no exterior porque é impossível explicar para os gringos e traduzir por exemplo: “Sérgio Malandro”. É verdade....coisas do gênio incompreendido. O bom e velho Mirisola está cada vez melhor. E como tenho conhecimento de causa e li todos os livros dele posso eleger os três melhores: “O Azul do filho morto” , “Bangalô’ e agora o “Charque”. Vamos mandar uns exemplares para a “Acadimia”, “Acadimia”, “Acadimia”.(essa é dele) Mirisola está pleiteando a vaga do Paulo Coelho. Tem meu apoio! Se precisar faço até campanha!

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Lendo romances com Orhan Pamuk


Geralmente nesse espaço coloco em foco análises superficiais de livros. Aos poucos fui abandonando a análise de músicas, discos, artigos de revista, shows e outras manifestações culturais. Estou errado! O site é de literatura e afins e não há qualquer motivo para priorizar a arte literária. Tudo é arte, tudo é vida, tudo é imitação da vida e tudo pode servir de enredo para escola de samba. Entendeu? Toda essa introdução é para indicar um artigo que reputo essencial para pretensos escritores e ávidos leitores. “Ler um romance” de Orhan Pamuk na revista Piauí de novembro, número 62. É um textão em todos os aspectos e se você tiver fôlego lá poderá aprender a diferença constatada por Schiller entre o escritor ingênuo e o sentimental e aumentar o seu arcabouço crítico quando estiver com os olhos enterrados em mais um calhamaço arcaico de papel ou com os olhinhos vidrados na tela do seu tablet. Marcelo Mirisola tem reservas em face da revista Piauí. Na minha modesta opinião ele também está errado. É uma das poucas revistas que nos permite um texto mais tranqüilo, estudado e longe da ejaculação precoce reinante nas fábricas de texto(bordéis?) espalhadas por aí. Sou contra misturar política com arte e a submissão artística ao capital. Mas definitivamente não vou deixar de ler ou escrever em uma determinada revista só porque ela é patrocinada por este ou aquele banco, por aquela ou aquela mesma empresa do ramo petrolífero. Acho que nesse ponto talvez eu me enquadre na classificação de Schiller como um escritor/leitor ingênuo. Fazer o quê!? Orhan Pamuk tem a tranqüilidade neste belo ensaio em demonstrar todas as nove "operações mentais" elaboradas por nossa mente durante a leitura de um livro de ficção citando e usando como exemplo livros fundamentais como “Don Quixote” de Cervantes, “Anna Kariênina” de Tolstoi, “A montanha Mágica” de Thomas Mann, “A Educação Sentimental” de Flaubert dentre outros. Toda essa “operação mental” (ler) visa uma busca incessante por uma identidade própria/nossa com o romance, “a idéia de um centro” que é, segundo Pamuk, o objetivo de todo o leitor. O texto ainda traz dicas fundamentais como essa: “Quando lemos um romance, a moralidade deve ser parte da paisagem, não algo que emana de dentro de nós e se volta contra as personagens”. Deixe a moral de lado meu caro; Não fique julgando o Raskólnikov de “Crime e Castigo” de Dostoievski como um membro de um júri em um regime ditatorial.Aliás, se me permitem, ando de saco cheio de Juízes implacáveis e acima de qualquer suspeita que peidam em seus gabinetes e botam a culpa no réu.(risos). Entendo que ao ler qualquer livro devemos deixar os nossos preconceitos de lado inserindo-se na paisagem como um homem invisível, uma névoa chegando devagar...devagarinho....como uma música do Martinho.(não resisti a esta deplorável riminha) Como muito bem concluído por Pamuk “cada frase de um bom romance suscita em nós um senso de conhecimento profundo e essencial do que significa existir no mundo”. Precisa dizer mais alguma coisa? Corra para a banca mais próxima e de quebra leia na mesma revista o ótimo texto de Ricardo Lísias que tem como mote às diferentes matizes entre a dor e a solidão após uma perda ou o esgotamento de uma fase. O título do texto é “Divórcio”. Bem sugestivo...

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

metamorfose ambulante



Relendo o livro ou conto "A metamorfose" de Franz Kafka, sempre sou surpreendido com a capacidade do escritor em dizer tanto de uma maneira tão sutil e com tanta imaginação. Uma estória meio sem sentido, flertando com o realismo fantástico serve para analisarmos as relações familiares, o trabalho, as relações sociais dentre outras inúmeras interpretações e estudos que o livro suscita. Mas a questão principal que fica(pelo menos para mim) é até onde vai a nossa tolerância com as diferenças nos diversos âmbitos, inclusive o estético e cultural.(???). Mais pop e atual impossível.(livro escrito em 1912 publicado pela primeira vez em 1915).

Mulheres de Bukowski


Será que existe assunto melhor? Que me desculpem os amantes do futebol e da cerveja, mas nada melhor do que falar, analisar e porque não deleitar-se com elas; é o mistério feminino que jamais será desvendado. O livro traduzido por Reinaldo Moraes é uma sucessão de erros e acertos de um escritor cinquentão no auge de sua maturidade entre junkies, putas, donas de casa, comerciantes, garçonetes, fãs de literatura, ricas, pobres, feias, bonitas, sujas, loucas.....até um final surpreendente onde Chinaski após toda a sua jornada assume a sua culpa, insignificância e sordidez perante um ser tão sagrado. Um verdadeiro Martinho da Vila ensandecido. Um Jece Valadão sem sua ridícula "conversão". E de todas aquelas e outras termina o livro com uma mulher improvável. O oposto. O “verso do reverso da medalha”. Para espanto do guru Drayer Baba (só lendo o livro para entender). No dizer de Sara, a mulher derradeira “-Trepar não é tão importante”. Pode isso???? Até o velho Buk (e o Mirisola também em seu “Joana a contragosto”...). Para espanto geral da nação Bukowskiana é dele(ou de Chinaski tanto faz) a seguinte frase: “um homem pode perder a sua identidade de tanto galinhar”. O que me leva a crer que esse negócio de machismo é só fachada, uma defesa natural do homem. Agora...essa literatura não é para qualquer um já que Bukowski como já salientado várias vezes escreve com sangue, fezes, porra e diversos excrementos sem poupar ele próprio, a sociedade, suas esquisitices e as pessoas que perambulam em sua circunferência. Tenta a todo custo demonstrar que a vida não é para amadores, para desavisados, para garotos(as) corados(as) com seus shortinhos em restaurantes da moda. Enfim, Bukowski é para quem gosta de ir direto ao clímax com poucas preliminares. Essa é minha introdução! (sem duplo sentido é claro).

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

- Ele é o cara!


Tá certo que Schopenhauer não é o principal jogador do Santos da atualidade ,não tem cabelo estilo moicano, mas um cara que tem “Schope” no nome e fala verdades sem qualquer receio ou pudor só poderia ser devidamente homenageado nesse espaço. A tempos que venho criticando o rebuscamento de linguagem e livros sem algo de substancial a dizer. Pois este livro de Schopenhauer “A arte de escrever” Editora L&PM, organizado, traduzido e prefaciado por Pedro Sussekind vai de encontro a quase tudo que penso e observo na literatura contemporânea. E olha que são textos extraídos do livro “Parega e Paralipomena” escrito pelo velho “Schope” em 1851. Poderia citar várias passagens que grifei mas em respeito a síntese e considerando o quanto exposto acima apenas esta é suficiente: “Quem tem algo digno de menção a ser dito não precisa ocultá-lo em expressões cheias de preciosismos, em frases difíceis e alusões obscuras, mas pode se expressar de modo simples, claro e ingênuo, estando certo com isso que suas palavras não perderão o efeito. Assim, quem precisa usar os artifícios mencionados antes revela sua pobreza de pensamentos, de espírito e de conhecimento.” (pág 84). E tenho dito! O velho “Schope” com todo o seu sagrado mal humor é o cara!!!!

De corpo e alma




Hilda Hilst em Biarritz (1957)

Ontem estive numa palestra de signos e literatura revendo uma antiga musa inspiradora. Ao contrário da Bruna Lombardi e Magda Cotrofe a escritora Hilda Hilst ao envelhecer foi ficando melhor(mulher uísque); e quanto mais o tempo passa, mesmo após a sua morte, mais entendo os motivos dela inspirar tanta inspiração em contrapartida às outras duas que só inspiravam tesões e gozos descartáveis em um passado longínquo de hormônios enfurecidos.(Desculpe Bruna! Desculpe Magda!) É que de Hilda Hilst eu gosto das curvas e da sensualidade de suas palavras que são únicas em seu contexto, são eternas. Como diria a própria : “líquidas, deleitosas, ásperas, obscenas”. E como não vou levar nenhuma delas para cama pelos mais diversos motivos e também porque não sou necrófago fico sem pestanejar com os livros que não me cobram sentimentos ou atuações. Não os livros de Bruna(que pecado! Um dia ela acerta a pena!) mas os de Hilda. Sei... sei que Hilda Hilst não quer sua alma na minha cama. Aliás a taurina nunca quis sua alma na cama de ninguém como decantado em um belo poema.(a Deus o que é de Deus!) Mas o que posso fazer? O corpo foi-se infelizmente. Ficaram somente algumas fotos amareladas, uma casa velha e a alma da poetisa em suas belas e erotizadas palavras. (-Os livros porra!) E posso garantir que não é pouco. Tesão incomensurável. No dizer da escritora nunca é tarde assim como é desejável transmudar-se. Será que estou amadurecendo ou é a morte dobrando a esquina? Onde foi parar minha coleção de “playboys” antigas? São tantas dúvidas....
(para Roberta)