Luiz Faro Zéfiro da Silva nasceu e passou quase toda sua
vida na pequena cidade de Brisas do Sul,
no estado de Minas Gerais. Um homem simples, de poucas palavras, trabalhador
rural, cabelos ralos, franzino, olhar distante e sonso, com bem vividos 50 anos
a base de muito repolho, couve-flor, nabo, cebola, maça crua e ovos de galinha
caipira. A personificação da tranqüilidade bucólica do povo mineiro. A noite
depois de seus afazeres no curral da Fazenda Ventania, gostava de sair com os
amigos e ir nos bares de esquina para tomar um pouco de cerveja Caracu, que
estranhamente misturava com Coca-cola para espanto de todos.
Depois de umas e outras
o pacato trabalhador rural transformava-se
no potente Luizoco, o oco mais temido do estado, quiçá do País. Tal alcunha lhe
foi conferida com méritos devido ao potente e sonoro flato que só ele tinha, capaz de fazer estremecer a
terra como um terremoto de grandes proporções e derrubar garrafas das prateleiras dos bares
que freqüentava.
Lá pelas tantas e depois de muita Caracu com Coca, era só
alguém começar, para o coro dos bêbados entoar: .” – Oco Oco Oco solta um
grande aí Luizoco. Oco Oco Oco solta um grande aí Luizoco...”
E numa performance apoteótica, depois de 30 segundos de
suspense e mistério, Luizoco soltava um persistente peido meteorológico de
trovão acordando os bêbados que a essa altura insistiam em levar um tête a tête
com às mesinhas do bar. Todos alegravam-se e riam admirados de tamanho e
incendiário dom e iam para casa felizes, assim como Luizoco que ia dormir
orgulhoso e satisfeito por poder proporcionar um pouco de alegria às pessoas
sofridas de sua pobre comunidade.
Sua fama espalhava-se como rastro de cobra n,água, desde os
rincões das fazendas mais escondidas da região até chegar ao gabinete do
Prefeito da cidade que, sabendo da fantástica estória e do famoso peido sete
tiros, resolveu tirar proveito eleitoreiro da situação convocando formalmente
Luizoco através de ofício escrito para comparecer a uma reunião urgentíssima e
secreta na Prefeitura;
- Seu Luiz, bons ventos o trazem, satisfação recebê-lo aqui
no gabinete da Prefeitura.
- Parzer é todo meu seu Perfeito.
- Pois bem, sente-se aí que eu vou direto ao assunto que, como o Sr. Sabe, não
sou homem de meias palavras.
- Pois pó sortá homi de Deus, sô todo orvido
- Fiquei sabendo que o Senhor tem um peido queima olho assassino que entoa mais
alto que labareda em canavial ah ah ah é
verdade?
- Se o povo fala quem sou eu pra desdize!!!
- Pois então homem de Deus, o Senhor é um homem de sorte,
temos que valorizar os talentos da cidade, mormente um talento assim, como o
seu, tão, digamos, peculiar, “sui generis” .
- Pois diga o que c qué
logo omi de Deus para de dizê parlavra difíci.
- O negócio é o
seguinte, meu secretário de eventos e turismo descobriu na internet, que vai
ter daqui a um mês na Europa um
campeonato mundial de flatulência, em resumo, ganha o peido mais barulhento,
com medição por aparelho e tudo e gostaríamos de enviar o Senhor com todas as despesas
pagas pra representar a cidade e o País nessa jornada. Dinheiro não é problema,
pagamos tudo, hospedagem, inscrição, avião....sem contar o portentoso prêmio em dinheiro para primeiro colocado que
será todo seu.
- Vixi homi de Deus nunca andei disso não. Vião é pobrema tô
fora, sartei de banda, num vô mesmo. Ce é besta sô....
- Mas como assim Seu Luiz? Vai ser a sua glória. O Sr. vai
entrar para os anais da estória desta cidade. Se o Senhor ganhar, Brisas do Sul
vai ter a tão esperada projeção internacional que tanto sonhamos, podemos então
até criar um campeonato local, quem sabe até trazer o mundial para cá, seu
talento é indiscutível o Senhor vai conquistar o mundo meu caro e Brisas do Sul
vai crescer de vento em popa.
- Disculpa seu perfeito, sua intenção é boa, mas vião não
dá; Num vo mesmo e tenho dito, e agora cum todo respeito, tenho que ir andando
cuida das minha vaca e cume meu repolho que eu to cuma fome du cão, passar bem,
um bom dia pra vosmice.
De forma abrupta e inesperada Seu Luiz virou às costas e
saiu da Prefeitura decidido, deixando o Prefeito pasmo e boquiaberto. Vai ter medo de avião assim no inferno,
pensou o Prefeito e voltou aos seus enfadonhos afazeres diários.
No caminho para casa Luizoco encontrou a sua musa chamada Rosinha,
balconista da venda de secos e molhados do Seu Manuel, mulher nova, de fino
trato e belas curvas por quem ele vivia arrastando suas asinhas sem o mínimo
êxito. Pra impressionar a moça contou que estava saindo do gabinete do
Prefeito, do honroso convite para representar a cidade e o País e por fim sua
digna recusa. E está lhe falou com toda a sua educação de berço:
- Pois saiba que tu és um borra botas, perdeu a grande
chance da sua vida de merda. Frouxo do caralho. Bunda mole! Ah ah ah.
Indignado, cabisbaixo e com o peito em frangalhos Luizoco que é
católico mas com um pé no terreiro, foi consultar seu babalorixá de candomblé
que após várias cantilenas, cafungadas e fumegadas lhe disse em tom
professoral, de forma profética e com olhar vazio e perdido no espaço esotérico;
- Misifiu, não existe
ateu em pane de avião. Mas desse mal c num morre não. Vai com fé misifiu pra
conquistá o mundo e dela o coração;
E foi pensando no seu amor que ele disse sim ao Prefeito,
dedicou-se aos treinamentos, venceu seu
medo com doses cavalares de calmantes e sedativos, atravessou o oceano e desceu
na Finlândia na cidade de Utajärvi para representar Brisas do Sul e o Brasil no primeiro e
único Campeonato Mundial de Flatulência.
Chegando
no aeroporto de Helsinque, todo o esforço e superação empreendidos valeram a
pena. Luizoco foi recebido pelo embaixador brasileiro local com honras de
estado e salva de 21 tiros de canhão, diga-se, muito fraquinhos, perto dos seus
próprios petardos, pensou.
No
caminho para a cidade de Utrajarvi, num belo carro, numa bela estrada, em
companhia do afável embaixador, que desde a chegada mostrou-se um ótimo aliado
e parceiro, Luizoco foi apreciando a bela paisagem, os lagos enormes e
suntuosos, as montanhas cor de giz tão diferentes dos chapadões mineiros, bem
como foi checando os itens em sua matula e todo o equipamento de preparação
para o grande desafio que ainda estava por vir.
Estavam
lá, às calças e cuecas com fundilhos reforçados, os ovos de galinha caipira,
cebolas da roça, nabo da terra, couve-flor, maçã crua, repolho e vários litrões
de Coca-cola, bem como o indispensável e até então insubstituível engradado de
cervejas Caracu.
Pois
bem, chegando na bela cidade foram direto para o local do evento que já estava
começando. Ás regras eram bem simples, baterias individuais e eliminatórias,
três minutos para cada competidor expulsar os gases pelo ânus em porções
anormais provenientes do aparelho gastroentérico , ou seja uma distenção
voluntária ou involuntária do estômogo
ou dos intestinos por ar ou gases com o intuito de produzir o maior ruído em
decibéis possível medido por um decibelímetro e avaliado pelo corpo de jurados
composto por um fonoaudiólogo, um otorrinoralingologista e um engenheiro em
segurança do trabalho. Obrigatório o uso de calças ou bermudas e proibido
expelir fezes sob pena de eliminação.
Luizoco
não estava entendendo absolutamente nada
até que seu parceiro embaixador esclareceu às regras com toda a sua diplomacia
a là Arnaldo César Coelho.
-
A regra é clara: quem peidar mais alto ganha!!!
E
dito e feito lá estava ele cônscio de sua missão e no meio dos maiores peidorrentos do mundo,
todos com um perfil físico e psicológico muito parecido, gordos, fortes,
negros, brancos, muito amarelos, suados, barbudos, fedidos, malvados o que
causou um certo constrangimento já que só Luizoco era um típico mineiro
mirradinho e sonso, destoando sobremaneira
dos demais. Assim sendo, a princípio, ninguém colocou muita fé nos seus
dotes peidorrísticos, e não entendiam a razão daquele homenzinho franzino ter
viajado tanto e estar ali no meio dos maiorais, tomando sua cervejinha caracu
com Coca-cola e com aquela cara de Rock Balboa do Sertão mineiro.
Mas
bastou a primeira bateria eliminatória para o constrangimento virar a sensação
do pedaço.
Luizoco
simplesmente humilhou e desclassificou a grande esperança local Tony Phartman.
E olha que ele se deu ao luxo de economizar na flatulência emitindo um peidinho
pitila e engraçadinho de apenas 85 decibéis. O suficiente para ganhar a parada
e não humilhar os donos da casa. Um gentleman esse brasileiro, pensaram eles.
E
assim sucedeu-se a cada nova bateria eliminatória, conquistando fãs de todas as partes, até deu
autógrafos para a garotada.Camisetas com sua foto eram as mais requisitadas na
lojinha de conveniências.
Engraçado que enquanto todos os outros
concorrentes causavam repugnância e revolta na seleta platéia, Luizoco tinha
uma empatia natural com a galera; enquanto o estrondo dos demais causava susto
e aversão o seu flato altíssimo e em vários tons tinha ares cômicos trazendo
uma incompreensível alegria para o evento. Sua aparição como nos velhos tempos
era apoteótica, quase divina. Como se o ato de peidar fosse uma arte relacionada
a origem do universo, ao “Big Bang”, o bóson de Higgs. Ademais quem sabe Deus
em momento de extrema flatulência não soltou um pum gigante e criou o mundo?
Pois
retornemos ao que interessa:
Passaram-se
três dias como um vento.... E Luizoco chegou a semi-final para enfrentar aquele
que poderia por fim a sua meteórica trajetória.O famoso Mr. Metano, o campeão inglês. Era um homem
forte, alto, nojento e com uma ridícula
fantasia de tartaruga ninja que sinceramente não combinava nem um pouco com o
resto do contexto. Deu um peido de 1oo decibéis enorme, só que para sorte de
nosso representante o inglês provido de
excesso de vaidade e jactância deu um peido irresponsável, tipo freio de
bicicleta e deu aquela enorme e pastosa melada na cueca.
Conclusão:
Desclassificação imediata, e vaias, vaias, muitas vaias da platéia, sem contar
o desmaio de várias pessoas por asfixia.
E quem diria que ele, aquele franzino mineirinho de Brisas
estaria agora na grande final do primeiro e único Campeonato Mundial de
Flatulência. O grande dia finalmente havia chegado, mas a parada era duríssima,
talvez a maior parada de toda a pacata vidinha do nosso protagonista. E justo
no grande dia o imponderável aconteceu.
Ao olhar o engradado ao lado da cama viu que tinha tomado no dia anterior a
última cerveja caracu. O líquido que era o seu elixir da vida. A poção mágica
que misturada com os demais ingredientes alimentícios era responsável
exatamente pelo arroubo sonoro emitido pelo seu nobre instrumento gástrico.
Meu Deus onde poderia ele encontrar uma garrafa de cerveja
caracu na cidade de Utrajarvi
na região central da Finlândia??? Missão impossível claro.
O
seu aliado, companheiro e agora amigo de
todas as horas, o embaixador correu
desenfreadamente por todas às lojas de
cervejas, supermercados, bares e tabernas da região e nada, nada de Caracu.
E
Luizoco com ares de derrota, desânimo e
cagaço,, já antevendo uma provável humilhação não parava de repetir.
“- Sem Caracu nada feito
homi,
tamo fudido”.
Mas
o embaixador que era um homem muito vivido e inteligente, vislumbrando ou ao
menos desejando que tal dependência
fosse meramente psicológica, recolheu as garrafas vazias do quarto de hotel de
Luizoco inserindo nelas o líquido negro da deliciosa cerveja finlandesa
Nikolai, passando desta feita o bom e velho conto do vigário no rapaz peidante.
Contente
e confiante ao ver as falsificadas
garrafas de Caracu, num misto de delírio e felicidade Luizoco gritou.
“-
Vambora homi. É hoje que eu vou arrebentar as pregas da meu cu de tanto
peidar!!!!!!”
E nesse clima quente, tipo, queima olho, os guerreiros
entraram em campo para a mais dura batalha:
Lá estava ele no lado
direito do octógono; (ou seria um exágono?) o adversário dos adversários,
ex-pugilista, com seus dois metros de altura e com mal distribuídos 180 kilos de pura banha e
gases, o Russo CATIMBRAL, o homem que segundo à lenda carregava um coquetel
molotov no intestino, pronto para
detonar as maiores revoluções e rebeliões da face podre da terra. Seu peido,
além do ruído altíssimo era famoso por ser o mais catinguelento do mundo, com
um odor capaz de espantar os urubus de todas as espécies e levantar os mortos e as múmias das
catacumbas.
E do outro lado, bem, vocês já sabem, Ele, Luizoco, o oco
mais temido de Minas Gerais, quiçá do Brasil, que entrou no recinto ao som da
música “Eu quero ver o oco”, dos Raimundos. Brilhante idéia do inteligentíssimo
embaixador.
E o Russo CATIMBRAL era o primeiro a se apresentar, e assim
foi. Após quase dois minutos e meio de concentração, aquele homenzarrão enorme
curvou os joelhos como se fosse iniciar uma dança dos cossacos e expeliu um gás
pérfido e repugnante com um ruído de 112 decibéis quebrando vários copos na
platéia para espanto geral e comentários do tipo: já ganhou, coitado do
brasileiro, tão bonzinho......
Enquanto isso Luizoco se preparava tomando sua improvável
mistura de coca-cola com falsa cerveja caracu sem sequer perceber a farsa. “Cervejinha
xoxa essa? Parece que ta choca?”, pensava ele.
O embaixador na
Tribuna das Autoridades estava tenso. Será que a malfadada farsa vai dar certo?
O que será que vai sair dessa bunda Santo Cristo?. Meu Deus rogai por nós. O
embaixador além de inteligente era um homem muito religioso.
Mas o mineirinho de Brisas, como um burrão de raça não
refugou. Cumpriu sua sina. Subiu no Octógono(ou seria um hexágono) ao som de “eu quero ver o Oco, eu quero
ver o Oco” agora entoado com um estranho sotaque nórdico por sua eufórica e
simpática torcida. Idéia do embaixador é claro.
LUIZOCO após a protocolar concentração e 30 segundos de
suspense e mistério, , soltou de chofre o seu famoso trovão assassino, aquele
que viria a ser considerado por muitos estudiosos do assunto o maior dos flatos já produzidos e emitidos na face da terra,
quiçá do Universo, se é que extras-terrestres têm o poder sensorial da
flatulência. Vai saber. Dizem que o ruído superou os 120 decibéis que é o
máximo que o ouvido humano pode suportar
e que a velocidade dele ultrapassou todas as barreiras, chegando a ser
ouvido e sentido em diversas partes do planeta e até fora dele em algumas estações
espaciais tripuladas. Um verdadeiro terremoto de 9.5 na escala Ritchter, só
comparável ao maior terremoto da história ocorrido no Chile na cidade de
Valdívia em 1960.
No dia seguinte todos os jornais e mídia em geral eram
unânimes em afirmar. UM FENÔMENO, ALGO ALÉM DA COMPREENSÃO HUMANA.
A Revista Times estampou a foto de LUIZOCO com a bem bolada
legenda ‘O PELÉ DA FLATULÊNCIA”.
É claro que a fama e a glória entorpeceram e envaideceram
muito o nosso herói. Sempre acompanhado de seu amigo embaixador, foi
homenageado em grandes festas na capital Finlandesa e com o prêmio conquistado
comprou roupas novas, cuecas reforçadas e uma bela lembrança para levar para
Rosinha o seu amor, sua paixão. Uma bíblia em Finlandês. Idéia é claro do embaixador.
Aliás o embaixador não podia deixar o amigo sem saber da
farsa da Caracu e em uma dessas inúmeras festas de comemoração e homenagens,
após tomarem umas e outras, contou-lhe
toda verdade e encerraram a noitada às gargalhadas e tomando é claro a
fantástica Cerveja Nikolai nas gélidas ruas de Helsinque. Luizoco inclusive
trouxe em sua matula duas caixas da Breja Finlandesa para o Brasil e só bebe em ocasiões muito especiais.
Chegando em Brisas do Sul foi recepcionado pelo orgulhoso Prefeito,
desfilou em carro aberto pelas ruas da cidade, foi ovacionado e teve que
repetir exaustivamente nos bares da cidade a mesma estória que acabei de contar
acima, é claro que cadê vez com outras nuances, outras 50 tonalidades de marrom
e outras hipérboles muito maiores do que
as minhas, além das famosas performances apoteóticas.
Tudo ia muito bem para Luizoco, sua vida agora até parecia
um sonho, mas algo ainda lhe faltava....
Mas é claro.... precisava levar o presente para Rosinha, seu
grande amor, sua grande paixão. Quem sabe, em contrapartida, um terno abraço,
um beijo de júbilo e desejo e admiração pela sua façanha além mar? Afinal ela
foi a grande mola propulsora de tamanha jornada o Leitmotiv condutor de toda a
estória.
E lá chegando na venda, com o coração pulsando e saltitando
freneticamente, com a bíblia Finlandesa e duas garrafas de Nikolai para presenteá-la,
encontrou apenas o Seu Manuel, sozinho e cabisbaixo, contanto o seu dinheirinho
no caixa como sempre fazia;
- E aí homi, turdo bem? Quanto tempo heim? Cadê a Rosinha?
- Pois.... pois, tu não sabes?
- Fala logo homi de Deus?
- MORREU!!!
- MORREU? Mas como? Morreu de quê?
- Intestino preso! Muito triste.... Morreu asfixiada pelos
próprios GASES.
autor: Luiz Tinoco Cabral